Para estabelecer uma linha de sangue de cães com ótimas qualidades, é indispensável o recurso aos acasalamentos fechados, sejam próximos (inbreeding) ou remotos (linebreeding). Como já dito, é o parentesco entre os cães que vai garantir a homogeneidade genética e, consequentemente, de conformação dos cães que irão compor a linhagem. São os cruzamentos consanguíneos que fixam as características.
Entretanto, nem sempre os cruzamentos consanguíneos são os métodos indicados para corrigir certos defeitos ou obter determinadas características. Também, é bom lembrar que o uso indiscriminado do cruzamento consanguíneo pode acarretar perda de vitalidade e tamanho nos animais, chamada depressão endogâmica. Por isso, cada uma das técnicas de acasalamento merece uma analise:
1) Inbreeding - é o acasalamento entre parentes próximos, especialmente irmãos inteiros, pais e filhos e meio-irmãos. É o caminho mais rápido para se fixar características. Aliás, para se obter uma grande homogeneidade na linhagem, o indicado seria utilizar técnicas de acasalamentos sucessivos entre parentes como no caso do backcrossing - técnica pela qual se cruza um pai com filha, selecionado-se dessa ninhada uma fêmea, cruzando o avô com esta neta e assim por sucessivas gerações.
Uma objeção que se faz ao inbreeding é a de que ele induz anomalias e causa uma perda de vitalidade (depressão endogámica). Aqui cabe uma observação, o inbreeding não cria nada, apenas depura a linhagem, concentrando todo o seu potencial genético. Em outras palavras, o inbreeding traz à tona todas as características de uma linha de sangue, sejam elas boas ou ruins. Por isso, se os cães da linha de sangue carregam genes que podem causar alguma doença, certamente ela aparecerá em um programa de cruzamentos fechados. O outro lado da moeda também é verdadeiro, se após sucessivos cruzamentos fechados a linha de sangue não apresentou doenças hereditárias, os indivíduos que a compõe são geneticamente saudaveis.
Justamente por induzir a homogeneidade de conformação e genética, o inbreeding não é o método adequado para se obter rapidamente uma característica que não está na linhagem. Exemplificando, se o objetivo é encurtar pescoço de uma linhagem que tem produzido pescoço longo, o método mais rápido será um outcross com um cão de pescoço correto. O inbreeding, da mesma forma, não é o melhor método para se obter exemplares com características superlativas. Mais claramente, o inbreeding não produzirá um Buldogue Campeiro com 58 cm de cernelha. O inbreeding é o método mais indicado para se obter características intermediárias.
2) Outcross - é o acasalamento de animais sem parentesco ou de parentesco muito longínquo (acima da 6ª geração). Não pode ser o único método para se estabelecer uma linhagem. É que os cães a serem utilizados no outcross possuem material genético distante, permitindo uma grande variabilidade na descendência. Como já dito, é o método ideal para se obter uma característica não existente na linhagem e para selecionar aspectos superlativos de conformação. No outcross, para tentar controlar a variabilidade da progênie é sempre interessante utilizar indivíduos de conformação parecida (cruzamento entre semelhantes). Também, é aconselhável que, para realizar o outcross, escolham–se cães que sejam resultados de cruzamentos fechados.
3) Linebreeding - é o cruzamento entre parentes não muito próximos, tal como tio com sobrinha, entre primos, avô com neta, etc. Geralmente se diz que o linebreeding abrange o cruzamento entre cães que apresentem parentesco até a 5ª geração. O linebreeding é um meio termo entre o inbreeding e o outcross. É uma forma de assegurar uma certa homogeneidade da linha de sangue, evitando-se os riscos do inbreeding excessivo. Por ser um método de equilíbrio, é possível na sua utilização conjugar as vantagens do inbreeding com as do outcross. Em outras palavras, é um método que mantém uma certa homogeneidade, permitindo o aporte rápido de algumas características. Da mesma forma, pode possibilitar a seleção de características superlativas conjugadas a intermediárias.
Um método bastante eficiente de fazer isso partindo de um número pequeno de cães e evitando o excesso de consangüinidade é o de partir de dois machos e uma fêmea, sem relação de parentesco. Cada macho tem uma ninhada com a fêmea, e as filhas de um são cruzadas com o outro macho. A partir daí se usa o cruzamento de tio com sobrinha sucessivamente, de forma que haverá o envolvimento da herança genética dos três exemplares.
4) Cruzamento de semelhantes x cruzamento entre opostos - são métodos que não se atém necessariamente ao parentesco entre os exemplares. Para o cruzamento entre semelhantes, é essencial os exemplares que participem do acasalamento tenham as mesmas qualidades que se deseja perpetuar. Já o cruzamento entre opostos é a técnica pela qual se acasalam cães com características opostas para se obter uma progênie equilibrada (cruzamento entre um cão com garupa plana com uma cadela com garupa de inclinação excessiva). Em termos de seleção e perpetuação de características, o cruzamento entre semelhantes é um método superior em relação ao cruzamento entre opostos. É que mesmo que se consiga corrigir um defeito com base no cruzamento entre opostos certamente os defeitos anteriores reaparecerão nas gerações seguintes. Entretanto, o cruzamento entre opostos pode ser a única solução para corrigir um defeito, mas mesmo nesse caso o mais rápido possível deve-se retornar ao cruzamento entre semelhantes para que a característica possa ser perpetuada.
O ideal para corrigir defeitos não é utilizar o oposto. Ou seja, se o problema identificado é estatura baixa, o caminho para corrigir isso não é utilizar um cão no limite de altura máxima do padrão. Isso vai proliferar o extremismo antagônico e tende a produzir uma parcela reduzida de cães equilibrados. O ideal para corrigir um problema, salvo exceções, é utilizar um cão na medida ideal, ou o mais correto possível naquela característica. Corrigir o excesso de prognatismo se usa um cão com prognatismo correto e na um com ausência de prognatismo, por exemplo.
5) Nicking – é quando dois cães produzem melhores filhotes quando acasalados entre si do que com parceiros distintos. Trata-se de um grande achado na criação em que as características dos indivíduos se potencializam no acasalamento. A progênie desses dois exemplares deve ser sempre valorizada e é sempre indicada a sua repetição.
Os cruzamentos fechados são, portanto, a base da formação de uma linha de sangue. Acontece que a otimização do esforço no estabelecimento de uma linhagem exige a utilização de outros métodos. Um dos grandes segredos da criação é estabelecer um equilíbrio nas técnicas de cruzamento.
Conclusão
A multiplicidade de cores na raça Buldogue Campeiro e a variedade de tamanho dos cães indica que os tipos de cães que formaram a raça eram bem diferentes. É com base em tal constatação que um criterioso trabalho de criação nessa raça é indispensável, em face do amplo espectro genético envolvido na raça. Sem um esforço direcionado, há sempre o grande risco de retorno a características indesejadas como hipertipias (Buldogue Inglês), ou leveza (esgalgamento), assim como excesso de pele solta e barbelas (aspecto de Mastif). Em qualquer raça, estabelecer uma linha de criação é algo penoso, mas, em uma raça com tal variação de material genético, estabelecer uma uniformidade de plantel é ainda mais difícil, o que exige um maior domínio das técnicas de criação.